Wednesday, November 22, 2006

Pôxa, bicho

"Pôxa bicho, que história triste... Triste e bonita." A frase é do Roberto, analisando a vida de Paulo César Araújo, autor de "Roberto Carlos em Detalhes", mas poderia ser a sua, ao final das centenas de páginas do livro. O Roberto, aquele cara que cantou minha infância e voltou soberbo na minha fase adulta, é o homem dos olhos tristes, tristes como os da minha tia Ignês.
Na minha vida, posso dizer que falei com duas pessoas que fazem parte dela tanto quanto são parte dela, bicho: o Rei e o Lula, o nosso rei. Só por ter feito isso, antes dos 30, poderia ter feito o tempo parar e dizer "valeu, bicho".
Pára o tempo: outubro de 1999, interior da catedral de Nossa Senhora Aparecida. Roberto cantava pela vida da mulher, Maria Rita, o único amor de verdade, aquele que o faz parar cada entrevista e pensar e olhar mais triste. Foi meu primeiro encontro com o Rei, algumas semanas depois de meu coração ter ficado vazio e ferido, com marcas que o tempo demoraria a curar.
Dois meses depois, estava sentado em uma sala na zona sul de São Paulo. Em frente à minha cadeira, Luiz Inácio _quando criança, achava esse Inácio engraçado, porque era assim que minha tia Ignês havia ensinado minha prima a se defender das convulsões; minha prima morreu em abril, no take mais triste deste ano.
Fui tratado por Lula como um parceiro, um chapa. A conversa fluia porque Lula sabe conversar: tem falando o dom que o Rei tem cantando.
De novo peço que o tempo pare. Sobre a minha mesa, dois livros: o de Paulo César e outro, de Mario Morel, editado em 1981, sobre os primeiro passos de um líder sindical.
Está lá: ele é um líder nato, daqueles que não tem do que temer; dá respostas prontas, de sabedoria como mais enxergamos e de outra, que disfarçamos para não perceber _a sabedoria da vida e, bem bicho, essa ele tem muito.
Nessa hora, a história dos dois e a minha se encontram de novo, da mesma forma que se encontraram em 99. Posso voltar no tempo e lembrar das canções de Roberto executadas com um cabo de vassoura na mão, como microfone, no início dos 80; ou no final daquela década, pé firme no asfalto, marchando a Brigadeiro Luís Antonio de ponta a ponta para fazer um pouco de força e torcer para que nosso presidente tivesse barba e coração, como agora.
Não perdi as ilusões, como a maioria cisma de dizer agora. Os dois continuam aí, com a mesma verve com as palavras cantadas ou discursadas. Duas vidas tristes até, mas bonitas.

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